A multa por avanço de sinal vermelho constitui uma das principais infrações cometidas no Brasil. Difícil imaginar, num país com tanta criminalidade seguida de impunidade, que exista alguém que nunca tenha ultrapassado o sinal vermelho.
Por este argumento, a 17ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio cancelou uma multa aplicada a um motorista flagrado ao avançar um sinal à 1h24 da madrugada, na Avenida Maracanã, Zona Norte da cidade, num local considerado deserto e perigoso.
De acordo com o relator da apelação, desembargador Elton Leme, diante da descontrolada violência urbana do Rio de Janeiro, compete ao poder público demonstrar que, no local e horário da infração, proporcionava ao cidadão os meios razoáveis de segurança.
A ação havia sido movida por um motorista contra o Município do Rio de Janeiro. Por meio da própria notificação expedida pela Secretaria Municipal de Transportes, o motorista argumentou que, além do local ser sabidamente perigoso, no horário da infração não havia qualquer pedestre passando pela rua, ou mesmo outros veículos.
O pedido do motorista perdeu em primeira instância, mas ao analisar o recurso de apelação, a 17ª Câmara Cível do TJRJ, por unanimidade, reformou a sentença e assim, além de cancelar a multa, o município terá de retirar os sete pontos computados na carteira de habilitação do autor.
Em seu voto, o desembargador destacou que a situação de perigo e grave risco à vida, decorrente da violência urbana endêmica da cidade, constitui fato público e notório, assumindo dimensões tais só comparáveis, em números de mortes e mutilados, a territórios flagelados pela guerra.
“A situação é mais grave especialmente à noite, quando a cidade se torna praticamente despoliciada e o cidadão fica entregue à própria sorte, sendo obrigado a adotar táticas de sobrevivência, como o avanço cauteloso de sinais luminosos e a não observância de limites muito reduzidos de velocidades em áreas reconhecidamente de risco”, ressaltou o desembargador.
“Ao assim proceder – completou – o motorista busca evitar a ação de delinquentes que, não raros drogados e quase sempre em quadrilha fortemente armada, atacam a pé, de motocicleta ou de carro e estão dispostos a praticar atos extremos de violência, alvejando para matar até mesmo quando não há reação da vítima”.
O desembargador cita ainda a edição da lei municipal 4.892/2008, que veda a utilização dos sistemas eletrônicos de aferição de velocidade instalados em áreas de risco após as 22h.
Embora posterior ao caso julgado, a lei, segundo o desembargador Elton Leme, reforça a ideia de que o poder público que não cumpre sua obrigação de zelar pela segurança do cidadão não pode exigir dele, em situação de risco, a observância de regras que potencializam tal risco.
Desta forma, ponderou-se que é fato público e notório a situação de perigo decorrente da violência no Rio de Janeiro, e na madrugada o risco é potencializado devido ao escasso policiamento; A desobediência ao sinal de trânsito é justificável pelo medo de roubo, e tais motivos levam à mitigação do princípio da legitimidade, cabendo ao Poder Público demonstrar que no local e horário do cometimento da infração existiam meios razoáveis de segurança. Ale de aferição da velocidade não pode sobrepor a segurança.
MAURICIO EDUARDO MAYR é ADVOGADO, sócio do escritório Eduardo Mayr & Advogados Associados, fundador do canal DIREITO POPULAR na web e Delegado da Comissão de Prerrogativas da OAB/RJ. (21) 97120-5316 contato@direitopopular.com.br;
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