A vida imita a arte. Já faz tempo que a música popular vem se preocupando com a fragilidade das moradias destinadas à população de baixa renda.
Um trecho dizia: “esse barraco vai cair, eu não me canso de avisar, ele não tem alvenaria, não tem coluna para apoiar, ai eu não quero ver o dia dessa zorra desabar…”. Mas, de todo modo, como cantavam, de há muito, os Paralamas, “a esperança não vem do mar, nem das antenas de TV, a arte é de viver da fé, só não se sabe fé em quê”…
De fato, há um histórico de esquecimento na proteção das moradias destinadas à população carente, realçando os disparates sociais e econômicos do nosso país.
Mas o que poucos sabem é que foi editada a Lei n.13.465/17, convertendo em lei a Medida Provisória 759/16, dispondo sobre regularização fundiária rural e urbana, inclusive disciplinando o direito real de laje e estabelecendo regras para o condomínio de lotes. A conversão da MP em lei trouxe novidades importantes.
O direito real de laje é reconhecido a quem utiliza a superfície de um imóvel tomada “em projeção vertical, como unidade imobiliária autônoma”, desde que esteja caracterizada uma “unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo” ((conforme prevê o código civil no art. 1.510-A, caput e §1º). Ou seja, a laje precisa ter acesso autônomo e independente da unidade originária “base” (puxadinho).
Imagine-se a hipótese de um pai que concede a um dos filhos a construção de um outro imóvel na laje do seu. Se a construção tem acesso autônomo, não se confundindo com o bem originário, estará protegido pelas regras da laje.
Aliás, o titular do puxadinho terá, inclusive, escritura pública própria, a partir de uma matrícula aberta no Cartório, além de registro sobre a matrícula do imóvel sobreposto (art. 176, §9º, da Lei de Registros Públicos).
Com isso, o titular da laje pode, ilustrativamente, ofertá-la em garantia ou mesmo aliená-la, a título oneroso ou gratuito (CC, art. 1.510-A, §3º).
Se tratando de construção vinculada ao imóvel originário, como no exemplo do pai que, sobre o imóvel-base, constrói não apenas uma estrutura para o filho que vai casar, mas, também, ali mantém uma área de lazer, como churrasqueira ou serviço, como lavanderia, ou constrói um acesso interno pelo próprio imóvel originário, não se tratará de direito real sobre a coisa alheia. Nessa hipótese, tratar-se-á de mera benfeitoria ou acessão em relação ao imóvel-base, a depender da finalidade, submetida à teoria da gravitação (já que o acessório segue o principal e ao seu titular pertence). Não haverá, nesse caso, registro imobiliário autônomo.
Em se tratando de laje autônoma e independente, haverá registro no cartório de imóveis, sem que isso importe em qualquer direito sobre a área já construída do bem original. Aliás, o titular da laje não pode, inclusive, prejudicar a segurança ou mesmo a linha arquitetônica ou estética do edifício.
Assim, o titular da laje somente pode conceder a sobrelaje (direito real de laje sucessivo) a um terceiro com expressa aquiescência do titular do imóvel originário e dos demais titulares de laje, se for o caso, além do aval do Poder Público, respeitadas as posturas e regras de construção.
Outra novidade é que se um dos titulares (do imóvel sobreposto ou do puxadinho) pretende alienar onerosamente a sua unidade, ele precisará ofertar, primeiro, ao outro (notificação, judicial ou extrajudicial, com prazo mínimo de 30 dias), permitindo, assim, a aquisição da plenitude da propriedade e havendo mais de uma laje, a preferência será do titular da laje mais próxima da unidade sobreposta, para atender à racionalidade da norma.
Há uma incidência do velho ditado de que “quem tem o bônus, assume o ônus”. Isso porque na medida em que o titular da laje passa a ter direito real sobre ela, responderá, consequentemente, pelas obrigações fiscais dela decorrentes.
Mas, não é só. O titular da laje também deve contribuir, proporcionalmente, com as despesas comuns de conservação e serviços. Assim, incidem as regras relativas à taxa de condomínio e admitida, inclusive, a penhora do bem de família para adimplemento da despesa.
Em segundo, o direito de laje exigirá adequações no âmbito registral, fundiário e processual. Isso é certo e incontroverso!
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